FAQ’s

01: Diagnóstico e critérios clínicos

Existe défice de atenção sem hiperatividade? É PHDA na mesma?

Sim. Quando as dificuldades estão sobretudo na atenção (e não na hiperatividade ou impulsividade), o diagnóstico é PHDA – apresentação predominantemente desatenta. É a mesma condição, apenas com uma forma de manifestação diferente. As apresentações podem mudar ao longo da vida.

Como obtenho diagnóstico de PHDA através do Serviço Nacional de Saúde?

É aconselhável começar por marcar consulta com o médico de família, explicando as dificuldades e a suspeita de PHDA.

O médico pode avaliar a situação e fazer o diagnóstico ou encaminhar para outra especialidade.

O médico de família pode diagnosticar e tratar PHDA?

Sim. O médico de família pode avaliar, diagnosticar e prescrever medicação para a PHDA.

No entanto, muitos profissionais optam por encaminhar para outra especialidade para garantir um diagnóstico diferencial completo e definir o plano terapêutico mais adequado.

Qual a idade mínima para o diagnóstico de PHDA? O meu filho tem 4 anos, já pode ser diagnosticado?

O diagnóstico pode ser feito a partir dos 4 anos, se houver evidência clara e consistente dos sinais em mais do que um contexto e impacto funcional, com base numa avaliação clínica detalhada. No entanto, em muitos casos, antes dos 6 anos, pode ser difícil distinguir comportamentos típicos da idade das características da condição.

Existe algum teste de rastreio de PHDA para adultos?

Sim. Existem questionários de rastreio — como o ASRS v1.1 — que ajudam a identificar sinais de PHDA em adultos. No entanto, estes instrumentos não substituem uma avaliação clínica. Servem apenas como ponto de partida: se houver suspeita, é importante procurar um profissional de saúde qualificado (médico ou psicólogo) para uma avaliação completa.

Existe alguma análise de sangue ou exame de diagnóstico de PHDA?

Não. O diagnóstico da PHDA é clínico — ou seja, não se confirma através de um exame de sangue ou de imagem, mas sim de uma avaliação detalhada da história de vida, das características e do impacto funcional.

02: Direitos, apoios e legislação

Devo dizer à minha entidade patronal que tenho PHDA?

Não existe qualquer obrigação legal de informar o empregador sobre o diagnóstico de PHDA. A informação sobre o estado de saúde é considerada dado pessoal sensível, estando protegida pelo Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (RGPD) e pelo artigo 17.º do Código do Trabalho, que impõem o dever de confidencialidade e limitação do tratamento de dados pessoais.

A decisão de partilhar esta informação é pessoal e deve ser ponderada de acordo com o grau de confiança existente na relação laboral e com a necessidade prática de adaptações no local de trabalho. Em muitos casos, revelar a condição pode ser benéfico, sobretudo se existir impacto a PHDA estiver a impactar no desempenho profissional, a organização das tarefas ou o bem-estar no trabalho.

O Código do Trabalho (art. 85.º) e a Lei n.º 46/2006, de 28 de agosto, garantem o direito a adaptações razoáveis para trabalhadores com deficiência ou doença crónica — uma categoria que pode abranger a PHDA, quando esta provoca limitações funcionais relevantes e duradouras. Essas adaptações podem incluir ajuste de tarefas, prazos, ambiente de trabalho, teletrabalho parcial ou horário flexível. No entanto, estas medidas só podem ser aplicadas se o empregador conhecer a necessidade concreta, pelo que a comunicação, embora facultativa, pode ser essencial para ativar os direitos de inclusão e apoio.

A partilha da informação deve ser feita de forma confidencial, preferencialmente através do médico do trabalho ou do departamento de recursos humanos, e apenas na medida necessária para justificar o pedido de adaptação razoável. O empregador está legalmente vinculado ao dever de confidencialidade (art. 17.º CT) e não pode utilizar essa informação para discriminar, penalizar ou despedir o trabalhador.

A Lei n.º 46/2006 proíbe expressamente qualquer ato de retaliação ou discriminação com base na deficiência ou condição de saúde, classificando a violação desse dever como contraordenação muito grave. Assim, a comunicação da PHDA deve ser uma escolha informada e segura, feita com o objetivo de garantir as adaptações necessárias e promover um ambiente de trabalho inclusivo.

Tenho PHDA e dificuldade em cumprir horários, posso pedir horário flexível na minha empresa com base na minha dificuldade?

Sim, é possível ter direito a adaptações razoáveis no local de trabalho, incluindo horário flexível, desde que se demonstre que a PHDA tem impacto funcional significativo no desempenho profissional.

O artigo 85.º do Código do Trabalho impõe ao empregador o dever de adotar medidas adequadas, em função das necessidades do trabalhador com deficiência ou doença crónica, para garantir o acesso, o exercício e a progressão no emprego, desde que tais medidas não impliquem encargos desproporcionados. De forma complementar, a Lei n.º 46/2006, de 28 de agosto, proíbe a discriminação em razão da deficiência ou do risco agravado de saúde e considera discriminatória a recusa de adaptações razoáveis (art. 5.º).

Embora estas normas usem a expressão “deficiência”, não exigem qualquer certificação formal. Ou seja, o Atestado Médico de Incapacidade Multiuso (AMIM), que resulta da Tabela Nacional de Incapacidades, é apenas necessário para efeitos de apoios sociais, benefícios fiscais ou quotas de emprego, mas não é obrigatório para o exercício de direitos laborais. O empregador deve basear-se no impacto funcional real da condição, que pode ser comprovado por relatório médico, psicológico ou parecer do médico do trabalho, sem necessidade de atestado multiusos.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica a PHDA na CID-11 (código 6A05) como uma perturbação do neurodesenvolvimento que pode afetar funções cognitivas, emocionais e sociais. Este enquadramento é consistente com o modelo biopsicossocial da deficiência adotado pela Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD), que Portugal ratificou em 2009, e que define deficiência com base na funcionalidade e nas barreiras contextuais, e não apenas na existência de um diagnóstico clínico ou certificação administrativa.

A Convenção n.º 159 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), também ratificada por Portugal, complementa este quadro internacional, ao determinar que todas as pessoas com deficiência — incluindo as que apresentam limitações mentais, cognitivas ou psicossociais — têm direito a reabilitação profissional e acesso ao emprego em condições de igualdade. Esta convenção adota um conceito amplo e funcional de deficiência, coerente com o modelo biopsicossocial da OMS e da CDPD, reforçando o dever dos empregadores de garantir adaptações razoáveis, ambientes inclusivos e ausência de discriminação no trabalho.

Contudo, é importante reconhecer que, em Portugal, a Tabela Nacional de Incapacidades (TNI) — usada para emitir o AMIM — ainda segue um modelo médico e pericial, centrado em sequelas físicas ou danos corporais, o que faz com que a PHDA raramente seja reconhecida como deficiência para efeitos de atribuição de certificado multiusos. Assim, a nível internacional, a PHDA é considerada uma forma de deficiência funcional, mas a nível nacional, o reconhecimento formal ainda não está plenamente consolidado.

Em termos práticos, isto significa que uma pessoa com PHDA pode solicitar adaptações no trabalho (como horário flexível, pausas estruturadas, teletrabalho parcial ou reorganização de tarefas), desde que comprove que essas medidas são necessárias para desempenhar as suas funções em condições de igualdade. O pedido deve ser apresentado de forma confidencial e fundamentada, preferencialmente com apoio do médico do trabalho ou dos recursos humanos.

Caso o empregador recuse o pedido sem fundamentação adequada, essa recusa pode constituir discriminação, nos termos da Lei n.º 46/2006 e da CDPD (art. 27.º).

03: Intervenção farmocológica

Só o médico psiquiatra pode prescrever estimulantes ou médicos de outras especialidades também podem?

Os médicos de outras especialidades também podem prescrever psicoestimulantes.
Recomendamos solicitar ao médico de família colocar como medicação habitual para facilitar o pedido de renovação.

Que fármacos não estimulantes existem para o tratamento da PHDA? São igualmente eficazes?

Os fármacos não estimulantes disponíveis em Portugal são a Atomoxetina e a Clonidina. Quando comparados com os estimulantes, não são tão eficazes, pelo que não são usados em primeira linha, a não ser que haja contraindicações para a toma de estimulantes.

Os medicamentos para PHDA têm impacto no apetite e no peso corporal?

Os fármacos utilizados no tratamento da PHDA, em particular os psicoestimulantes,
podem influenciar o apetite e, consequentemente, o peso corporal. É comum observar uma redução do apetite durante o período de ação do medicamento, o que pode levar a uma ingestão menor de alimentos. Outros medicamentos, incluindo alguns não estimulantes ou fármacos utilizados no tratamento de comorbidades, também podem afetar o apetite, mas os efeitos são mais variáveis, podendo tanto aumentá-lo quanto diminuí-lo.

Apesar destas alterações, é possível manter uma alimentação equilibrada através de
estratégias simples, como planear refeições e lanches em horários adequados,
especialmente fora do pico de ação do medicamento, e optar por refeições pequenas, mas nutricionalmente densas, que forneçam energia e nutrientes suficientes ao longo do dia. Sempre que necessário, recomenda-se discutir com o médico ajustes no horário da toma, na dose e no tipo de fármaco, e com o nutricionista ajustes na dieta.

04: Tratamentos complementares e estilo de vida

Que suplementos ajudam na PHDA?

Diversos suplementos têm sido estudados no contexto da PHDA. A evidência científica disponível indica que apenas alguns apresentam benefícios, e apenas em situações de deficiência nutricional comprovada. Entre os suplementos mais investigados estão os ácidos gordos ómega-3, vitamina D, magnésio, zinco, vitaminas do complexo B e ferro.

Estudos preliminares também têm explorado o papel de probióticos, com ênfase na modulação da microbiota intestinal, no entanto, os resultados ainda são preliminares, não havendo, de momento, evidência suficiente para recomendar a sua suplementação.

É importante sublinhar que a suplementação deve ser sempre individualizada, integrada num padrão alimentar equilibrado e nunca utilizada como substituição da terapêutica padrão.

O Neurofeedback como tratamento para a PHDA funciona?

Apesar dos potenciais benefícios apontados em alguns estudos, atualmente, não existe evidência científica consistente que comprove a eficácia do neurofeedback como tratamento para a PHDA. As principais guidelines internacionais não o recomendam como intervenção de primeira linha.

Que alimentos deve a pessoa com PHDA comer?

Não existem alimentos específicos que funcionem melhor para todas as pessoas com PHDA; a escolha alimentar deve sempre considerar as necessidades individuais, o estado metabólico, condições fisiológicas e particularidades clínicas. De forma geral, tal como para a população em geral, pessoas com PHDA beneficiam de padrões alimentares equilibrados.

O padrão alimentar que demonstra mais benefício na PHDA privilegia alimentos não processados, incluindo proteínas, hidratos de carbono complexos, frutas, vegetais e gorduras saudáveis, ao mesmo tempo que limita alimentos ultraprocessados e açúcar.

A dieta mediterrânica mostra-se particularmente protetora, por privilegiar alimentos frescos, peixe gordo, azeite, frutos secos e hortícolas, com baixa ingestão de açúcares e produtos ultraprocessados. Esta abordagem tem sido associada a melhores perfis neurocomportamentais e metabólicos, tanto em crianças como em adultos com PHDA.

O açúcar piora os sintomas da PHDA?

Persiste a ideia de que o consumo de açúcar agrava os sintomas da PHDA, mas a
evidência científica disponível não confirma uma relação causal entre a ingestão de
açúcar e o aumento da hiperatividade ou da impulsividade. Ainda assim, é comum
observar, entre pais e até entre alguns profissionais de saúde, a perceção de que o
açúcar tem um efeito negativo nos sintomas da perturbação.

O que está demonstrado é que o açúcar, por si só, não é responsável pelo agravamento dos sintomas. No entanto, padrões alimentares ricos em açúcares simples tendem a estar associados a uma dieta globalmente desequilibrada e pobre em nutrientes essenciais, o que pode, indiretamente, afetar o bem-estar geral e a regulação comportamental.

Apesar da ausência de uma relação direta entre o consumo de açúcar e a PHDA, uma alimentação equilibrada e com baixo teor de açúcares adicionados é recomendada, por contribuir para a saúde global e favorecer uma melhor regulação neurocomportamental e metabólica.

O café dá sono a quem tem PHDA?

Sim, pode acontecer a algumas pessoas com PHDA. A cafeína pode ter um efeito
paradoxal: em vez de causar agitação ou insónia, o consumo de café pode induzir
sensações de calma e até favorecer o sono. Este fenómeno contrasta com o efeito
típico da cafeína na população geral, em que predominam a hiperestimulação e a
dificuldade em adormecer.

Esta resposta paradoxal está relacionada com o funcionamento neurobiológico da
PHDA. A cafeína, enquanto estimulante do sistema nervoso central, pode normalizar temporariamente a atividade cerebral. No entanto, o seu efeito é altamente individual e algumas pessoas com PHDA podem, pelo contrário, sentir-se mais ansiosas ou inquietas. É fundamental discutir o consumo de cafeína com o médico, sobretudo se estiver a tomar medicação para a PHDA.