
PHDA na idade adulta
Entre as exigências e o equilíbrio
A passagem para a idade adulta traz novas responsabilidades — gerir um trabalho, uma casa, relações, finanças e decisões importantes. Para muitas pessoas com PHDA, esta fase torna-se um verdadeiro ponto de viragem: as exigências aumentam e muitas das estruturas que antes ajudavam (família, rotinas escolares, professores, serviços pediátricos) deixam de estar presentes. Sem esse apoio, dificuldades que antes eram compensadas tornam-se mais evidentes.
É também comum que o diagnóstico só apareça nesta etapa, depois de anos de dúvidas e tentativas de “dar conta do recado” sozinhos.
- Algumas pessoas chegam à idade adulta com consequências claras e visíveis: instabilidade profissional, dificuldades económicas, consumo de substâncias, conflitos familiares ou até problemas legais.
- Outras parecem “funcionar bem” por fora, mas por dentro vivem um esforço constante: ansiedade, stress, exaustão e a sensação permanente de estar a falhar ou de estar sobrecarregadas.
A idade adulta pode ser uma fase de descoberta e reorganização, mas também de frustração, especialmente quando a pessoa sente que “sabe o que devia fazer, mas não consegue fazer o que sabe”.
Desafios na idade adulta
À medida que as exigências aumentam e os apoios diminuem, tornam-se mais visíveis as consequências negativas da PHDA em diferentes áreas. Estas dificuldades variam de pessoa para pessoa, mas tendem a surgir em domínios que exigem organização, atenção constante, memória funcional, regulação emocional e consistência.
Trabalho e percurso profissional
- Tendência para deixar tarefas para a última hora.
- Atrasos frequentes.
- Distrair-se facilmente em tarefas longas ou repetitivas (reuniões, aulas ou tarefas administrativas).
- Começar várias tarefas sem concluir as anteriores.
- Mudanças de emprego frequentes ou impulsivas.
- Ciclos de entusiasmo seguido de bloqueio (“8 ou 80”).
- Ocupar uma posição abaixo das próprias competências.
- Dificuldade em planear a longo prazo.
- Conflitos com colegas ou chefias.
- Equilíbrio trabalho–família frágil, com risco de burnout.
- Falhar pormenores (ou trabalhar extremamente devagar para evitar erros).
- Formações ou cursos deixados a meio ou com rendimento inferior ao esperado.
Relações e Vida Familiar/Doméstica
- Começar ou terminar relações de forma impulsiva ou por aborrecimento.
- Discussões frequentes e falhas de comunicação.
- Dificuldades na vida sexual (dificuldade em atingir o orgasmo, tomar decisões impulsivas/arriscadas).
- Ter a casa desorganizada.
- Subestimar o tempo necessário para tarefas domésticas.
- Dificuldade em gerir dinheiro, guardar recibos, pagar contas ou planear despesas.
- Compras impulsivas que afetam o orçamento familiar.
- Dificuldade em manter hábitos saudáveis (sono, alimentação, rotina).
- Demorar semanas a tratar de coisas práticas do dia a dia (ex.: marcar consultas, arranjar algo na casa).
- Esquecer comida ao lume ou deixar roupa dias na máquina.
- Medo de iniciar novas relações.
Interação Social
- Não parecer atencioso (ex.: não responder mensagens, não dar os parabéns, não telefonar).
- Interromper frequentemente.
- Ser visto como inconveniente ou desinteressado.
- Esquecer o que foi combinado em conversas.
- Expressar opiniões impulsivamente.
- Falhar compromissos ou chegar atrasado.
- Baixa assertividade devido a experiências negativas.
Tempos Livres, Hobbies e Comportamentos de Risco
- Dificuldade em relaxar (ou não gostar de atividades “relaxantes”).
- Necessidade de muita atividade física para aliviar a tensão.
- Dificuldade em terminar livros, filmes ou atividades longas.
- Mudar frequentemente de hobbies.
- Perder-se no tempo em atividades de grande interesse.
- Procurar atividades de risco ou muita adrenalina.
- Condução rápida, reativa ou distraída.
- Maior propensão para jogo problemático.
- Comer compulsivamente.
- Comer compulsivamente.
- Maior consumo de tabaco, álcool, cafeína ou substâncias ilícitas.
Autoconfiança, Emoções e Autoestima
- Insegurança devido a críticas acumuladas ao longo da vida.
- Baixa autoestima causada por falhas repetidas.
- Reações intensas a críticas ou rejeição.
- Autocriticismo elevado.
- Reações emocionais intensas e impulsivas, seguidas de arrependimento.
- Perfeccionismo.
- Tristeza e frustração relacionadas com as dificuldades.
Potencialidades e forças
Apesar dos desafios, muitos adultos com PHDA revelam capacidades valiosas, como:
- Criatividade
- Inovação
- Intuição e empatia
- Rapidez e eficácia em situações de pressão
- Humor e entusiasmo contagiante
Em ambientes dinâmicos, flexíveis, colaborativos ou criativos, estas características podem transformar-se em forças. Empresas que adotam práticas neuroinclusivas beneficiam da forma diferente como estas pessoas abordam problemas, tomam decisões e encontram soluções.
Muitos adultos desenvolvem ainda estratégias compensatórias inteligentes e formas inovadoras de lidar com as suas dificuldades. A diferença entre sofrimento e potencial depende, muitas vezes, do contexto.
A Visão da Sociedade
Apesar da informação disponível, ainda existe muito estigma associado à PHDA na idade adulta:
- Muitas dificuldades são vistas como “coisas de criança” ou “banais”;
- Pedidos de apoio são, por vezes, recebidos com surpresa ou julgamento;
- As necessidades são desvalorizadas ou encaradas como falta de responsabilidade.
O estigma impede muitas pessoas de procurar diagnóstico, acompanhamento ou até de partilhar as suas dificuldades, contribuindo para isolamento e sofrimento acrescido.
No entanto, esta não é a realidade em todos os contextos.
Hoje, existe um interesse crescente pela PHDA:
- Mais profissionais formados e interessados na área
- Mais pessoas a falar abertamente sobre o tema
- Figuras públicas a partilhar as suas experiências
- Famílias, organizações e equipas que começam a adotar práticas mais inclusivas
Em ambientes onde há menos estigma e uma verdadeira valorização da neurodiversidade, muitas pessoas com PHDA prosperam. Ainda há um longo caminho a percorrer, é verdade — mas estamos a dar passos importantes rumo a um futuro com mais entendimento, mais inclusão e menos julgamento.